Era madrugada. Toda a
casa silenciara com o sono e sonhos de seus habitantes. Mãe, pai e dois irmãos
menores, 8 e 5 anos cada, dormiam insuspeitos de minhas aventuras.
Debaixo da coberta, à
luz de uma lâmpada em seu soquete, as letras formavam palavras e estas
compunham mundos diferentes daquele no qual me encontrava. Não me recordo qual
narrativa romanesca me aprisionava em seu enredo. Só sei dizer que era um
daqueles romances de Banca de Jornal, cujas autoras eram Júlia ou Bárbara e
traziam na capa algum casal apaixonado.
Eu tinha pouco mais
de 12 anos, estava na sexta série e esta é a primeira lembrança que tenho em
relação ao meu fascínio pela leitura. E eu a tenho tão viva porque está
associado a outra: minha professora de ciências, Dona Dalva, me chamando a
atenção: “Feitosa, Feitosa, esta leitura não é adequada para você!”.
Em casa ninguém lia.
Meus pais não frequentaram a escola. Não dominavam a leitura e a escrita. Então
não sei precisar por que comecei a ler esses romances “açucarados”. Lembro-me de
que eu e outra colega de sala, Sueli, trocávamos esses romances. Hoje justifico
essa escolha acreditando que minha personalidade na época, tão tímida e
introspectiva, tinha nessa leitura algum alento.
Depois dessa “chamada
de atenção” e porque admirava demais essa professora, passei a me preocupar com
o que lia. Então fui apresentada à série Vaga-lume e li na sétima e oitava séries,
quase todos os livros de José de Alencar. É desse período a leitura de “Diva” e
“O tronco do ipê”, do autor e “O caso da Borboleta Atíria”, cujo nome do autor
não me recordo.
Mais tarde, no Ensino
Médio, vieram outros livros, como “Capitães de Areia” e “O Cortiço”. Mas a
leitura dos Best sellers de Sidney
Sheldon e outros autores como Harold Robins continuava. O bom dessa leitura
paralela foi a possibilidade de comparação que surgiu: percebi que as leituras
de entretenimento eram pouco críticas, algumas até muito próximas a roteiros de
cinema. E isso me fez querer conhecer mais clássicos. É certo, porém, que a
paixão pela leitura se interpunha a qualquer critério avaliativo, por essa
razão continuava à procura, nos ditos clássicos, de temáticas apaixonantes,
aventureiras, dramáticas, ficcional, de época. Lembro-me de “Ivanhoe” de Walter
Scott, “Os três mosqueteiros” de Alexandre Dumas.
O principal, no
entanto, entre mim e a leitura, é que ela sempre foi e é um refúgio: no término
de um relacionamento de 5 anos, foi por meio da leitura que preenchi o oco que
ficou em meu coração. Ainda queria ser a heroína salva, mas principalmente, era
o aventureiro, o desbravador, o destemido.
Quando escolhi cursar
Letras, tinha um objetivo: na época li “Os sofrimentos do Jovem Werther” de
Goethe e outros autores românticos. Queria me aprofundar nessa leitura mais
criteriosa e clássica. Esse desejo, porém, foi frustrado pela minha inépcia em
relação à língua alemã, e outros fatores de ordem econômica. Queria ser uma
crítica literária. Mas a paixão pela língua, pela palavra e o fato de a análise
não combinar com meu espírito de leitora apaixonada me levaram por outros
caminhos.
Hoje meu repertório
de leitura abrange tanto Platão, Descartes, Tolstói, Saramago, Carlos Drummond,
Cecília Meireles, Os Veríssimo: Érico e Luís Fernando, Fernando Sabino, Orhan
Pamuk, Jane Austen, Elizabeth Gaskell, Eça de Queiroz, Shakespeare, como best sellers de Dan Brown, Rick Riordan,
J. K. Rowling, Stephen King dentre tantos outros... Além dos teóricos da língua
e da pedagogia como Saussure, Bosi, Paulo Freire, Chartier, Koch, Orlandi,
Platão, Van Dijk, Kleiman e muitos mais...
A leitura, para mim, é
o sopro de outra imaginação dentro da minha e isso é simplesmente encantador.
Amei! Belo relato professora, e que ótimo gosto, "namoramos" os mesmos livros! Você me fez ter vontade de revisitar alguns velhos "casos", kkkkk... Obrigado por encantar minha noite.
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